sábado, 4 de julho de 2009

Exoneração de Fiador que deixou de ser sócio da empresa

O Tema acima possui fundamentos jurisprudenciais que tornam possível a exoneração da garantia de fiança a partir da saída dos fiadores do quadro societário da pessoa jurídica afiançada. Esse é o entendimento que vem prevalecendo no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e foi mais uma vez adotado pela Quinta Turma ao julgar um recurso interposto por dois empresários paulistas.
De acordo com o processo trata-se de questão semelhante a que estamos questionando, os fiadores prestaram fiança num contrato de aluguel à empresa Lananda Art Indústria e Comércio Ltda. porque integravam o quadro societário daquela pessoa jurídica. Entretanto, houve uma transferência da totalidade das quotas sociais e a empresa passou a ter novos sócios, continuando a ocupar o mesmo imóvel. Em razão disso, os ex-sócios e fiadores enviaram aos locadores notificação extrajudicial para garantir que fossem exonerados de continuar prestando a garantia da fiança.
Os novos sócios da empresa recorreram para tentar garantir o contrato de locação, mas a ministra Laurita Vaz, baseando sua decisão em precedentes do STJ, concluiu que os fiadores tinham o direito de solicitar a exoneração, uma vez que se haviam retirado da sociedade. "O entendimento majoritário desta Corte Superior de Justiça é no sentido de que o contrato acessório de fiança obedece à forma escrita, é consensual, deve ser interpretado restritivamente e no sentido mais favorável ao fiador. Desse modo, não pode a fiança subsistir à mudança do quadro societário da locatária sem que, expressamente, tenha o fiador concordado", esclareceu a ministra em seu voto.
A ministra também ressaltou que os fiadores, para fazer uso do direito de ser exonerados da obrigação contratual (artigo 835 do Código Civil), precisam garantir a segurança jurídica e o exato cumprimento dos contratos comunicando a exoneração ao locador por meio de notificação extrajudicial, o que foi devidamente providenciado pelos ex-sócios, ou ainda por meio de ação judicial, se houver necessidade. Sendo assim, tornou-se irrelevante do ponto de vista jurídico que o contrato locatício tivesse sido estipulado por prazo determinado e estivesse ainda em vigor. A Quinta Turma, por unanimidade, acompanhou o voto da ministra relatora no Processo nº AI 788.469.
Vejamos o que diz o artigo 835 do Código Civil:
“o fiador poderá exonerar-se da fiança que tiver assinado sem limitação de tempo, sempre que lhe convier, ficando obrigado por todos os efeitos da fiança, durante sessenta dias após a notificação ao credor”.
Apenas por debate, cita-se ainda jurisprudências:
"LOCAÇÃO E PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 535, INCISO II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚMULA N.º 284 DO STF. FIANÇA PRESTADA POR SÓCIO DA EMPRESA INQUILINA. RETIRADA DO SÓCIO DA PESSOA JURÍDICA. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL. EXONERAÇÃO DOS FIADORES. AGRAVO PROVIDO. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO." (fl. 126). AgRg no AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 788.469 - SP (2006⁄0138029-5)”. (grifo nosso).
"Recurso Especial. "Locação de imóvel não residencial. Fiança. Exoneração de Fiança. Venda do estabelecimento comercial. Anotação na Junta Comercial sobre a transferência das cotas societárias a terceiros. Celebração de uma nova relação locatícia. Responsabilidade limitada dos antigos sócios da empresa locatária, fiadores até a data do registro, na Junta Comercial, da transferência das cotas societárias."
"Celebrada a locação de imóvel não residencial para viger por cinco anos e tendo havido cessão das cotas sociais da empresa locatária para terceiros, após dois anos e dez meses do seu início, com anotação da transferência na Junta Comercial, bem como comprovada a existência de tratativas entre o novo sócio e os locadores para alteração do contrato da locação, no qual o novo sócio figuraria como locatário e tendo ainda seu pai como seu avalista, cabível o pedido de exoneração da fiança prestada pelos antigos sócios, ora demandantes, pois com o início da nova relação locatícia operou-se a extinção da relação locatícia primitiva e conseqüente extinção da fiança."
Entendimento este que se harmoniza com o do STJ, vejamos:
“Recurso não conhecido." (REsp 655.096⁄SP, 5.ª Turma, Rel. Min. JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, DJ de 21⁄11⁄2005.)
"AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. LOCAÇÃO. FIANÇA PRESTADA EM RAZÃO DE PARENTESCO COM SÓCIO DA EMPRESA INQUILINA. RETIRADA DO SÓCIO DA PESSOA JURÍDICA. DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE AFIANÇADA. EXONERAÇÃO DA FIADORA.
1. O contrato acessório de fiança obedece à forma escrita, é consensual, deve ser interpretado restritivamente e no sentido mais favorável ao fiador. Desse modo, não pode a fiança subsistir à mudança no quadro societário da locatária, sem que, expressamente, tenha o garante a esse fato anuído.
2. Decisão agravada que se mantém por seus próprios fundamentos.
3. Agravo regimental desprovido." (AgRg nos EDcl no REsp 586.370⁄SP, 5.ª Turma, de minha relatoria, DJ de 20⁄06⁄2005.)
"LOCAÇÃO. FIANÇA. PESSOA JURÍDICA EXONERAÇÃO DOS FIADORES. SAÍDA DE SÓCIOS.
É assente neste Tribunal o entendimento de que o instituto da fiança não comporta interpretação extensiva, obedecendo, assim, disposição expressa do artigo 1.483 do Código Civil. Não obstante distinção entre a pessoa do sócio e a pessoa jurídica, é possível a exoneração da garantia prestada à sociedade após a retirada dos sócios aos quais se deu a garantia originalmente.
Recurso não conhecido." (REsp 373.671⁄MG, 5.ª Turma, Rel. Min. FELIX FISCHER, DJ de 11⁄03⁄2002.)
"LOCAÇÃO. FIANÇA. EXONERAÇÃO DOS FIADORES. GARANTIA PRESTADA EM RAZÃO DA AMIZADE OU PARENTESCO COM OS SÓCIOS. RETIRADA DOS SÓCIOS. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL DA VONTADE DE EXONERAÇÃO DA FIANÇA”.
Ressalte-se que a fiança é contrato de natureza intuitu personae e se interpreta estritamente. Malgrado distinga-se a pessoa dos sócios da pessoa jurídica, é possível a exoneração da garantia prestada à sociedade após a retirada dos sócios em função dos quais se deu essa garantia substituídos por estranhos à fidúcia original. A fiança, como obrigação acessória, extingue-se com a principal e, também, pelo acontecimento de qualquer dos casos que extinguem as obrigações em geral, como o pagamento, a novação, a transação, o advento, a remissão, a anulação, dentre outros.
É o nosso entendimento majoritário, portanto, que o contrato acessório de fiança obedece à forma escrita, é consensual e deve ser interpretado restritivamente e no sentido mais favorável ao fiador. Desse modo, não pode a fiança subsistir à mudança no quadro societário da locatária, sem que, expressamente, tenha o garante a esse fato anuído. Em razão disso, os garantes devem enviar notificação extrajudicial, buscando eximir-se da garantia prestada. Conclui-se, ainda, que a partir do momento em que os autores se retiraram da sociedade, a fiança por eles prestada perdeu efeito porque desnaturada a relação ensejadora da garantia.
Conclui-se que o instituto da fiança não comporta interpretação extensiva. Não obstante distinção entre a pessoa do sócio e a pessoa jurídica, é possível a exoneração da garantia prestada à sociedade após a retirada dos sócios aos quais se deu a garantia originalmente, bastando uma notificação extrajudicial da vontade de exoneração da fiança, ou caso não seja suficiente a impetração de uma ação judicial.

Kelly Mota. OAB/CE nº 19.324

Um comentário:

  1. A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aprovou, por unanimidade, novas súmulas, verbetes que pacificam oficialmente o entendimento do STJ sobre variados temas. São elas: Súmula 417 - projeto da ministra Eliana Calmon - "Na execução civil, a penhora de dinheiro na ordem de nomeação de bens não tem caráter absoluto". Súmula 418 - projeto do ministro Luiz Fux - "É inadmissível o recurso especial interposto antes da publicação do acórdão dos embargos de declaração, sem posterior ratificação". Súmula 419 - projeto do ministro Felix Fischer - "Descabe a prisão civil do depositário judicial infiel". Súmula 420 - projeto do ministro Aldir Passarinho Junior - "Incabível, em embargos de divergência, discutir o valor de indenização por danos morais". Súmula 421 - projeto do ministro Fernando Gonçalves - "Os honorários advocatícios não são devidos à Defensoria Pública quando ela atua contra a pessoa jurídica de direito público à qual pertença".

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